download (1)Brasília, 10 de setembro – A Assembleia Geral da ONU adotou nesta terça-feira (9/9) uma recomendação solicitada pela Argentina e com o aval do G77+China para redigir um marco legal que regule as reestruturações das dívidas soberanas.

A recomendação “Para o estabelecimento de um marco legal multilateral para os processos de reestruturação da dívida soberana” foi aprovada por 124 votos a favor, 11 contra (entre eles o dos Estados Unidos) e 41 abstenções em uma reunião na sede das Nações Unidas em Nova York.

O texto determina que seja “elaborada e adotada através de um processo de negociações intergovernamentais, com caráter prioritário durante a 69º sessão (da Assembleia Geral), um marco legal multilateral para os processos de reestruturação da dívida soberana a fim de, entre outros pontos, aumentar a eficiência, a estabilidade e a previsibilidade do sistema financeiro internacional”.

Para a Argentina, que propôs a iniciativa através do G77+China, atualmente presidido pela Bolívia, trata-se de um apoio internacional em meio à sua disputa contra os fundos especulativos que ganharam uma ação judicial nos EUA pelo pagamento de 100% do valor dos títulos da dívida em moratória desde 2001.

Estes fundos, classificados de “abutres” por Buenos Aires por terem comprado os títulos podres, conseguiram fazer com que o juiz federal Thomas Griesa bloqueasse o pagamento aos 93% dos credores que aceitaram aderir às reestruturações da dívida argentina em 2005 e 2010, o que levou o país à moratória parcial no dia 30 de julho.

Além da esperada oposição dos Estados Unidos, também votaram contra a recomendação Reino Unido, Japão, Alemanha, Canadá, Austrália, Israel, República Tcheca, Irlanda, Hungria e Finlândia. México, França, Itália e Espanha se abstiveram. O México foi o único país da América Latina que não votou a favor da criação do marco legal.

“Hoje acontece com a Argentina, mas muitos países em desenvolvimento e inclusive desenvolvidos têm sofrido com a mesma conduta predadora e continuarão sofrendo se não agirmos agora”, disse o representante permanente da Bolívia na ONU, Sacha Llorenty, em nome do G77+China.

“Os fundos abutres representam um risco para todos os países que venham a passar por um processo de reestruturação da dívida”, acrescentou o embaixador, que acredita que a falta de um marco legal global sobre essa questão “é um grande fracasso da arquitetura financeira internacional”. “Graças à Argentina, a comunidade internacional está abrindo seus olhos a um risco grandíssimo”, concluiu.

Um alcance em dúvida

O chanceler argentino Héctor Timerman, presente em Nova York, afirmou que a resolução é um “reflexo fiel da relevância e urgência” do tema. “Nada mostra com mais clareza a necessidade de um marco regulatório do que a situação do meu país”, afirmou em um discurso durante o debate.

“Temos que estabelecer um limite, que vá além da retórica”, acrescentou Timerman em referência aos fundos especulativos, que ele definiu como “sinistros senhores da opulência”.

A recomendação, que em suas quatro páginas não menciona a Argentina, afirma que “o esforço de um Estado por reestruturar sua dívida soberana não deve ser frustrado ou impedido por credores comerciais, incluindo fundos de investimentos especializados como os fundos de risco”.

O novo marco legal para facilitar reestruturações das dívidas soberanas será votado “antes do final de 2014”, segundo o texto, que pede uma intensificação dos esforços para melhorar os mecanismos de prevenção e solução de crises relativos a esta questão “em cooperação com o setor privado”.

Paralelamente à essa estratégia multilateral, o governo argentino avança com um projeto de lei no Congresso que autoriza o país a estabelecer Buenos Aires e Paris como sedes de pagamento da dívida, em resposta ao bloqueio judicial que impede que os credores da dívida reestruturada recebam o pagamento em Nova York.